“Cinema Paradiso.” – Por José Luiz Ricchetti

C76287D9-2BD4-4664-82C4-AA6D345FE54C

Não sei se vocês já tiveram a oportunidade de assistir ao filme ‘Cinema Paradiso’, esta obra prima do cineasta italiano, Giuseppe Tornatore.

Ontem à noite pude assistir, novamente em CD, este filme maravilhoso, que figura na minha lista de ‘Top 10’ dos que já assisti.

No filme o personagem principal, Salvatore (Totó) é um cineasta bem-sucedido que vive em Roma e que um determinado dia recebe um telefonema de sua mãe avisando que Alfredo o seu grande amigo, e quase um pai para ele, havia morrido. Alfredo trabalhava como projecionista dos filmes do cinema da sua cidade natal, o ‘Cinema Paradiso’.

Aquela notícia lhe trouxe de volta as maravilhosas lembranças da sua infância e, principalmente daquele cinema, para onde ele, o Totó, fugia sempre que podia, assim que terminava a missa da igreja, onde era coroinha.

Totó costumava ficar escondido, vendo os filmes proibidos, atrás das cortinas do cinema, onde o vigário da cidade, censurava todas as imagens, onde pudesse aparecer algum beijo ou então uma cena mais quente……

Assim que terminei de ver o filme, me recordei que também tive o meu ‘Cinema Paradiso’. Foi durante a minha infância, lá na minha pequena cidade natal de São Manuel.

Ele se chamava ‘Salão Paroquial’ e também tinha um censor, o irrequieto vigário da cidade à época, José Radici, e onde a projeção dos filmes ficava a cargo de um leigo católico, o diácono da igreja o ‘Irmão Aldo’.

O prédio ficava ali na região central da cidade, bem na Av. Irmãs Cintra, ao lado da Casa Paroquial, bem atrás da Igreja Matriz, onde moravam os padres da Consolata, Congregação Missionária da Igreja Católica, à qual todos eles eram filiados.

A sua construção era bem antiga, tendo um largo e comprido corredor lateral, como se fosse uma grande entrada de garagem.

Era ali naquela entrada, que nós crianças, logo depois do catecismo, ficávamos perfilados, formando uma grande fila, bem em frente aquelas portas de cor bege, construídas de várias folhas, emendadas por dobradiças e que dava acesso ao salão de projeção, a plateia como dizíamos.

O salão não era tão grande, era simples, eu diria até, bem espartano, com cadeiras de madeira, daquele tipo auditório, que levantam e abaixam o assento, e me lembro bem, que na parte de trás das poltronas, tinha um decalque de fundo verde e letras amarelas, com a marca: ‘Móveis Cimo’.

Com todas essas pequenas lembranças e detalhes, fica impossível esquecer as inúmeras vezes em que, durante as cenas dos filmes, aquelas mesmas com cenas de beijo ou com alguma parte mais quente, mais explícita, se podia ouvir o berro do atento vigário, ao seu dedicado assistente:

Cortaaaaaa Aldo!!!!

Ahh…Meu Cinema Paradiso, o velho salão paroquial onde o vigário Radici encarnava o padre Adelfio, o irmão Aldo vivia o Alfredo, aquele quase pai do Totó, o garoto que via todos os filmes, escondido, por detrás das cortinas.

E quem éramos todos nós, as crianças?

Ahh…Claro que éramos os verdadeiros ‘Totós’, carregados da mesma curiosidade, da mesma emoção lúdica, da mesma esperteza, de garoto do interior, todos prontos, ali naquele cinema, para assistirmos os maravilhosos filmes, da nossa rica infância.

Quem, por acaso não se lembra de torcer, batendo com os pés no chão, quando aparecia na tela uma daquelas perseguições, do mocinho, montado em seu cavalo, galopando, atrás do bandido?

Como esquecer dos primeiros filmes de cowboy de Roy Rogers montando o seu lindo cavalo ‘Trigger’ com seu cachorro ‘Bullet’ e mais o inseparável amigo no Jeep de nome ‘Nellybelle’?

E da série ‘O Paladino do Oeste’, onde o personagem, todo de preto, se apresentava com um cartão de visita, com uma figura de um cavalo de jogo de xadrez e a inscrição bem abaixo: “Have Gun-Will Travel”?

E do fantástico Zorro e o seu traje também preto, usando capa, máscara e chapéu, montando o seu cavalo Tornado, imprimindo a marca “Z” com a espada, nos inimigos, sendo perseguido pelo engraçado Sargento Garcia?

E da outra série ‘Bat Masterson’, onde havia aquele senhor elegante que resolvia crimes e prendia bandidos e que só se apresentava de chapéu-coco e sua inseparável bengala?

E dos filmes de Tarzan com sua macaca Chita, sempre nadando perto de ferozes crocodilos e subindo em árvores para dar aquele seu grito ecoando na floresta, na voz do ator ‘Johnny Weissmuller’: – Aôôôôôô….Aôôôôôô……Aôôôôôô !!!!

Gritos que eu sempre gostava de imitar, quando brincava com os amigos, do alto da mangueira, no fundo do quintal de casa.

Sem falar então, que me veio também à mente, todos aqueles filmes épicos, que eram repetidos à exaustão, quase que todo mês, como se já estivessem ali no projetor do cinema, todos os dias, prontos para serem novamente exibidos, na última sessão do domingo de noite, tais como ‘Ben-Hur’, ‘Hércules’ e ‘Os 10 mandamentos’.

Como, também não se lembrar do filme mais triste, aquele que fazia muita gente chorar, “Marcelino, Pão e Vinho’ o menino inventor de histórias e seu amigo imaginário, os milagres e as inúmeras conversas com Jesus, ao pé da cruz, no convento de frades.

E o que falar então das engraçadas comédias do caipira Mazzaropi, como: ‘O Corintiano’, ‘A tristeza do Jeca’, ‘Jeca tatu’, ‘O vendedor de Linguiça’, ‘O Chofer de Praça’, ‘Jeca e a Égua milagrosa’ e tantos outros.

Puxa! Não me dera conta ainda que foi ali, naquela nossa pequena cidade do interior, no simples salão paroquial, que vivemos tudo isso, todos esses sonhos impossíveis, todos esses prazeres proibidos, todos esses amores infinitos, sem nos darmos sequer conta.

Foi ali, com certeza, que aprendemos a romper as barreiras das nossas mentes e nos entregamos às fronteiras do acaso, para começarmos todos a sonhar.

Éramos felizes e não sabíamos!

E para terminar esta crônica, peço licença poética para parafrasear este mago do cinema, Charles Chaplin:

Acho que foi ali no nosso modesto ‘Cinema Paradiso’, que começamos a aprender a falar sem aspas, amar sem interrogação, sonhar com reticências e viver sem ponto final!

Políticas de privacidade

Este site usa cookies para que possamos oferecer a melhor experiência de usuário possível. As informações de cookies são armazenadas em seu navegador e executam funções como reconhecê-lo quando você retorna ao nosso site e ajudar nossa equipe a entender quais seções do site você considera mais interessantes e úteis.