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CAPÍTULO XIV – FESTA DA APARECIDA E A CANECA DE ALUMÍNIO

cabeca-ricchetti CAPÍTULO XIV - FESTA DA APARECIDA E A CANECA DE ALUMÍNIO

Assim que deixamos São Manuel e as peladas, percebi que o nosso Ford transpassou outra vez a estratosfera, depois reentrou na atmosfera e furou um grupo de espessas nuvens, até darmos de cara com um céu azul. O sol forte castigava o meu rosto, mas o frio e o vento de inverno, não havia nos deixado em paz.

Minha preocupação com as rateadas do motor e o nível de combustível ainda permaneciam.

Eu não tinha a menor ideia de como fazer para reabastecer e com certeza para viajar àquelas altas velocidades, o combustível não podia ser gasolina. Na verdade, eu não sabia nem que combustível o nosso Ford 46 usava para poder fazer essas viagens no tempo.

image-6 CAPÍTULO XIV - FESTA DA APARECIDA E A CANECA DE ALUMÍNIO

Aos poucos o carro foi diminuindo de velocidade, descendo até contornar a torre de uma pequena Igreja, em um povoado simples, que me era familiar, até aterrissar numa daquelas suas ruas estreitas.

Olho novamente o entorno da Igreja e noto uma grande movimentação de pessoas e inúmeras barracas e ambulantes. Olhei o relógio do painel e me dei conta que estávamos no dia 15 de agosto de 1965. Era dia da ‘Festa da Aparecida’!

Todos os anos, no dia 15 de agosto, logo pela manhã, nós todos da família já nos preparávamos para ir à missa das 10 horas no Santuário de Aparecida de São Manuel. Era lá, nesse pequeno distrito, pertencente à minha cidade natal, que transcorria, todos os anos, a festa em comemoração à N.S. Aparecida.

Esta festa era famosa e muito esperada por todos da cidade, mas também pelos demais habitantes da região da alta sorocabana. A festa tinha barracas de todo tipo, formando uma grande quermesse, onde todos se reuniam, sempre no entorno da Igreja.

Cada devoto levava suas esperanças e promessas, numa demonstração de fé, em louvor à Nossa Senhora Aparecida. Durante todo o dia havia também as rezas de terços, as várias missas e a tradicional procissão, que ocorria no final da tarde, percorrendo as pequenas e poucas ruas daquele distrito.

Nessa época o Seminário de Padres de São Manuel tinha um prédio adjunto por lá e era comum vermos os seminaristas e padres professores, circulando pela quermesse, suando muito debaixo daquelas suas compridas batinas pretas, feitas de lã pesada, com botões encapados e uma larga faixa também preta na cintura.

Apesar disso, víamos todos contentes, carregando aquele crucifixo pesado no peito e um sorriso no rosto, até porque aquela festa era uma das poucas oportunidades no ano em que eles podiam romper a clausura e a rigidez do internato.

“Aparecidinha”, como era carinhosamente chamada por todos, tinha praticamente quatro ruas principais, que eram justamente aquelas que formavam o quadrilátero em volta da praça e da igreja, bem no centro da vila.

Todo esse perímetro, no dia da festa, era lotado de barracas e carrinhos, com os mais variados tipos de comidas, produtos em geral e uns cem números de vendedores de bugigangas.

Do lado esquerdo da igreja ficavam as barracas de comidas, começando com a grande barraca dos padres, ao lado do seminário, montada com madeira de eucalipto, coberta com encerado de caminhão e repleta de mesas.

Ali os padres serviam normalmente um delicioso churrasco, daqueles feitos em fogo de chão, quando se abre uma vala na terra, colocam-se as toras de lenha e depois os vários espetos de pau com as carnes, fincados à volta do fogo, para poder assar.

Logo abaixo, existia também uma outra barraca grande, que servia frango assado, o que hoje chamaríamos de galeto, mas que na época era um bom e gordo frango caipira, acompanhado de uma bela polenta, à moda italiana e um delicioso vinho caseiro, desses de garrafão.

Depois vinham, na sequência, mais uma dúzia de barracas menores que vendiam entre outras coisas, pastel, garapa, o refrigerante local “Princesinha” ou “Marly”, cachorro-quente, sanduíches de mortadela, de pernil e de linguiça calabresa e mais uma variedade de doces, pudins, bolos, quindins, doce de amendoim, fio de ovos e muitos outros quitutes.

Além dessas barraquinhas, havia também os carrinhos que vendiam a pipoca, o quebra queixo, pé de moleque, geleia colorida (aquela de cor opaca e gosto de maisena) e o que não podia faltar, os tabuleiros das deliciosas maçãs do amor.

No final da rua, o que mais chamava a atenção era a grande fila que se formava em frente a uma casa simples, de esquina. Nessa fila se viam muitos bebês, no colo de suas mães, várias senhoras, todas com suas sombrinhas por causa do sol, e uma quantidade expressiva de moças.

Ali era a casa da Dona Benedita, a famosa benzedeira, residente há muitos anos ali no Distrito de Aparecida e bastante procurada por muitos. Era ela que tirava o mal olhado, cobreiro, quebrante, fazia rezas para encontrar um novo amor ou até para conseguir marcar a data do casamento, daquelas moças que tinham um noivo tipo “bagre ensaboado” ou seja, aquele noivo que era liso para fugir do casório.

Do outro lado da Igreja ficavam as barraquinhas de produtos em geral e bugigangas. Era gente vendendo de tudo, panelas de ferro, caminhõezinhos de madeira, estilingues, pipas, cata-ventos coloridos, bonecas, toalhas de crochê, panos de prato, calças, blusas e vestidos, chapéus, cintos, botas, botinas, borzeguins com sola de pneu, arreios, freios para cavalos, pelegos coloridos de lã de carneiro e tantas outras coisas.

Em qualquer canto que se olhasse, se podia ver ambulantes, vendendo alguma coisa. Era um tal de vendedor de facas, canivetes, fumo de corda, cigarros de palha, isqueiros a fluido (as famosas “bingas”) até aqueles que vendiam bexigas coloridas, petecas, bichinhos de pelúcia, brinquedinhos de pilha etc. Era tudo isso junto e misturado com algodão doce, pipoca, pirulitos e arroz doce de pacote, para delírio da molecada e desespero dos pais.

O nosso Ford, nossa máquina do tempo, como que adivinhando e querendo me premiar com todas aquelas lembranças que se passavam pela minha cabeça, tinha aterrissado, exatamente em frente a uma barraquinha de bugigangas, dessas onde eu costumava comprar, quando criança, as canecas coloridas de alumínio com o meu nome gravado.

Logo me lembrei que, quando dos meus 10 ou 11 anos de idade, eu gostava de ficar ali observando atento, o trabalho do velho artesão, gravando os nomes das pessoas. Ele utilizava letras que pareciam ser do tipo “gótica” e no final, quando ia gravar a última letra, costumava fazer um rococó qualquer, talvez com a intensão de dar um toque de arte, na gravação.

Agora, muitos anos depois, eu estava ali novamente e não podia perder essa chance. Desci do carro e encomendei logo uma daquelas canecas coloridas com o meu nome gravado.

Enquanto isso fui dar umas voltas pelas barraquinhas de doces em busca daqueles cones de papel com amendoim torrado e da deliciosa maçã do amor.

Quem quer que fosse a festa da Aparecida, não saía de lá sem que tivesse provado o amendoim torrado e comido uma maçã do amor, sendo que no caso do amendoim torrado, o mais concorrido era feito pelas mãos hábeis do simpático “Dito Pipoqueiro”. 

Assim, voltar para casa sem uma caneca com o nome gravado, não comer o amendoim torrado e não provar uma maçã do amor, era talvez, exagerando, o mesmo que ir a Roma e não ver o Papa. Assim eu não podia perder a oportunidade de cumprir com essas três tarefas!

Naquele momento eu podia rever cada uma daquelas pequenas lembranças, que haviam se transformado, com o passar do tempo, em fragmentos de saudades, de um período ímpar da minha infância, que completavam agora meu lindo quebra cabeça.

É como se, de repente, elas me tivessem me transformado em um caçador de pedaços de mim mesmo, perdidos no tempo, trazendo todos à tona, novamente, para poder sentir cada uma dessas belezas, guardadas como joias de alegria no meu coração.

Alguém já disse uma vez, que a infância e a velhice são duas fases em que a felicidade só existe no abrir de uma caixa de bombons, mas eu digo que não!  Eu sou daqueles que acredita que a gente nunca envelhece, quando consegue manter na memória, para poder resgatar a qualquer tempo, todos esses pedacinhos mágicos de lembranças da infância.

Conforme disse o grande poeta Quintana “Triste é aquele que não conserva nenhum vestígio da sua infância”.

É por isso que acredito nessas pequenas lembranças, que embora, à primeira vista possam parecer, que nos aprisionam ao passado, são elas, que na verdade nos trazem de volta a alegria de reviver tudo outra vez, mesmo que só por alguns minutos, como se transformasse num belo sorriso estampado na nossa face.

Assim, enquanto estou ali, curtindo tudo isso e dando voltas pela praça, ouço um som de bip e percebo que me esqueci do tempo! O som que ouvi era único e bem característico! Era o som buzina do velho Ford! Eu sabia que se a buzina tocava era porque o tempo estava no limite de acabar.

Meu Deus! Não vai dar tempo de pegar a caneca colorida com o meu nome gravado!

Então saio correndo, engulo o que ainda resta de amendoim torrado, guardo no bolso o saquinho plástico com o pedaço mordido da maçã do amor e entro rapidamente no carro.

Mal fecho a porta ele trepida, rateia muito, mas finalmente arranca e sai voando mais uma vez pela teia do tempo.

Recosto, mais uma vez, minha cabeça no banco e enquanto ele fura as nuvens em busca, talvez, de mais um outro lugar no tempo e no espaço, me vem uma tristeza por não ter pegado a caneca colorida com meu nome gravado e ainda mais por saber que não tenho nenhuma daquelas antigas, guardada em casa.

Então eu penso que se me fosse permitido, voltar e reencontrar aquele velho artesão e pegar a caneca recém encomendada, eu pediria para ele acrescentar, logo abaixo do meu nome, gravado com as mesmas lindas letras góticas, apenas mais uma palavra:  Saudades…

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CAPÍTULO XIV – FESTA DA APARECIDA E A CANECA DE ALUMÍNIO

cabeca-ricchetti CAPÍTULO XIV - FESTA DA APARECIDA E A CANECA DE ALUMÍNIO

Assim que deixamos São Manuel e as peladas, percebi que o nosso Ford transpassou outra vez a estratosfera, depois reentrou na atmosfera e furou um grupo de espessas nuvens, até darmos de cara com um céu azul. O sol forte castigava o meu rosto, mas o frio e o vento de inverno, não havia nos deixado em paz.

Minha preocupação com as rateadas do motor e o nível de combustível ainda permaneciam.

Eu não tinha a menor ideia de como fazer para reabastecer e com certeza para viajar àquelas altas velocidades, o combustível não podia ser gasolina. Na verdade, eu não sabia nem que combustível o nosso Ford 46 usava para poder fazer essas viagens no tempo.

image-6 CAPÍTULO XIV - FESTA DA APARECIDA E A CANECA DE ALUMÍNIO

Aos poucos o carro foi diminuindo de velocidade, descendo até contornar a torre de uma pequena Igreja, em um povoado simples, que me era familiar, até aterrissar numa daquelas suas ruas estreitas.

Olho novamente o entorno da Igreja e noto uma grande movimentação de pessoas e inúmeras barracas e ambulantes. Olhei o relógio do painel e me dei conta que estávamos no dia 15 de agosto de 1965. Era dia da ‘Festa da Aparecida’!

Todos os anos, no dia 15 de agosto, logo pela manhã, nós todos da família já nos preparávamos para ir à missa das 10 horas no Santuário de Aparecida de São Manuel. Era lá, nesse pequeno distrito, pertencente à minha cidade natal, que transcorria, todos os anos, a festa em comemoração à N.S. Aparecida.

Esta festa era famosa e muito esperada por todos da cidade, mas também pelos demais habitantes da região da alta sorocabana. A festa tinha barracas de todo tipo, formando uma grande quermesse, onde todos se reuniam, sempre no entorno da Igreja.

Cada devoto levava suas esperanças e promessas, numa demonstração de fé, em louvor à Nossa Senhora Aparecida. Durante todo o dia havia também as rezas de terços, as várias missas e a tradicional procissão, que ocorria no final da tarde, percorrendo as pequenas e poucas ruas daquele distrito.

Nessa época o Seminário de Padres de São Manuel tinha um prédio adjunto por lá e era comum vermos os seminaristas e padres professores, circulando pela quermesse, suando muito debaixo daquelas suas compridas batinas pretas, feitas de lã pesada, com botões encapados e uma larga faixa também preta na cintura.

Apesar disso, víamos todos contentes, carregando aquele crucifixo pesado no peito e um sorriso no rosto, até porque aquela festa era uma das poucas oportunidades no ano em que eles podiam romper a clausura e a rigidez do internato.

“Aparecidinha”, como era carinhosamente chamada por todos, tinha praticamente quatro ruas principais, que eram justamente aquelas que formavam o quadrilátero em volta da praça e da igreja, bem no centro da vila.

Todo esse perímetro, no dia da festa, era lotado de barracas e carrinhos, com os mais variados tipos de comidas, produtos em geral e uns cem números de vendedores de bugigangas.

Do lado esquerdo da igreja ficavam as barracas de comidas, começando com a grande barraca dos padres, ao lado do seminário, montada com madeira de eucalipto, coberta com encerado de caminhão e repleta de mesas.

Ali os padres serviam normalmente um delicioso churrasco, daqueles feitos em fogo de chão, quando se abre uma vala na terra, colocam-se as toras de lenha e depois os vários espetos de pau com as carnes, fincados à volta do fogo, para poder assar.

Logo abaixo, existia também uma outra barraca grande, que servia frango assado, o que hoje chamaríamos de galeto, mas que na época era um bom e gordo frango caipira, acompanhado de uma bela polenta, à moda italiana e um delicioso vinho caseiro, desses de garrafão.

Depois vinham, na sequência, mais uma dúzia de barracas menores que vendiam entre outras coisas, pastel, garapa, o refrigerante local “Princesinha” ou “Marly”, cachorro-quente, sanduíches de mortadela, de pernil e de linguiça calabresa e mais uma variedade de doces, pudins, bolos, quindins, doce de amendoim, fio de ovos e muitos outros quitutes.

Além dessas barraquinhas, havia também os carrinhos que vendiam a pipoca, o quebra queixo, pé de moleque, geleia colorida (aquela de cor opaca e gosto de maisena) e o que não podia faltar, os tabuleiros das deliciosas maçãs do amor.

No final da rua, o que mais chamava a atenção era a grande fila que se formava em frente a uma casa simples, de esquina. Nessa fila se viam muitos bebês, no colo de suas mães, várias senhoras, todas com suas sombrinhas por causa do sol, e uma quantidade expressiva de moças.

Ali era a casa da Dona Benedita, a famosa benzedeira, residente há muitos anos ali no Distrito de Aparecida e bastante procurada por muitos. Era ela que tirava o mal olhado, cobreiro, quebrante, fazia rezas para encontrar um novo amor ou até para conseguir marcar a data do casamento, daquelas moças que tinham um noivo tipo “bagre ensaboado” ou seja, aquele noivo que era liso para fugir do casório.

Do outro lado da Igreja ficavam as barraquinhas de produtos em geral e bugigangas. Era gente vendendo de tudo, panelas de ferro, caminhõezinhos de madeira, estilingues, pipas, cata-ventos coloridos, bonecas, toalhas de crochê, panos de prato, calças, blusas e vestidos, chapéus, cintos, botas, botinas, borzeguins com sola de pneu, arreios, freios para cavalos, pelegos coloridos de lã de carneiro e tantas outras coisas.

Em qualquer canto que se olhasse, se podia ver ambulantes, vendendo alguma coisa. Era um tal de vendedor de facas, canivetes, fumo de corda, cigarros de palha, isqueiros a fluido (as famosas “bingas”) até aqueles que vendiam bexigas coloridas, petecas, bichinhos de pelúcia, brinquedinhos de pilha etc. Era tudo isso junto e misturado com algodão doce, pipoca, pirulitos e arroz doce de pacote, para delírio da molecada e desespero dos pais.

O nosso Ford, nossa máquina do tempo, como que adivinhando e querendo me premiar com todas aquelas lembranças que se passavam pela minha cabeça, tinha aterrissado, exatamente em frente a uma barraquinha de bugigangas, dessas onde eu costumava comprar, quando criança, as canecas coloridas de alumínio com o meu nome gravado.

Logo me lembrei que, quando dos meus 10 ou 11 anos de idade, eu gostava de ficar ali observando atento, o trabalho do velho artesão, gravando os nomes das pessoas. Ele utilizava letras que pareciam ser do tipo “gótica” e no final, quando ia gravar a última letra, costumava fazer um rococó qualquer, talvez com a intensão de dar um toque de arte, na gravação.

Agora, muitos anos depois, eu estava ali novamente e não podia perder essa chance. Desci do carro e encomendei logo uma daquelas canecas coloridas com o meu nome gravado.

Enquanto isso fui dar umas voltas pelas barraquinhas de doces em busca daqueles cones de papel com amendoim torrado e da deliciosa maçã do amor.

Quem quer que fosse a festa da Aparecida, não saía de lá sem que tivesse provado o amendoim torrado e comido uma maçã do amor, sendo que no caso do amendoim torrado, o mais concorrido era feito pelas mãos hábeis do simpático “Dito Pipoqueiro”. 

Assim, voltar para casa sem uma caneca com o nome gravado, não comer o amendoim torrado e não provar uma maçã do amor, era talvez, exagerando, o mesmo que ir a Roma e não ver o Papa. Assim eu não podia perder a oportunidade de cumprir com essas três tarefas!

Naquele momento eu podia rever cada uma daquelas pequenas lembranças, que haviam se transformado, com o passar do tempo, em fragmentos de saudades, de um período ímpar da minha infância, que completavam agora meu lindo quebra cabeça.

É como se, de repente, elas me tivessem me transformado em um caçador de pedaços de mim mesmo, perdidos no tempo, trazendo todos à tona, novamente, para poder sentir cada uma dessas belezas, guardadas como joias de alegria no meu coração.

Alguém já disse uma vez, que a infância e a velhice são duas fases em que a felicidade só existe no abrir de uma caixa de bombons, mas eu digo que não!  Eu sou daqueles que acredita que a gente nunca envelhece, quando consegue manter na memória, para poder resgatar a qualquer tempo, todos esses pedacinhos mágicos de lembranças da infância.

Conforme disse o grande poeta Quintana “Triste é aquele que não conserva nenhum vestígio da sua infância”.

É por isso que acredito nessas pequenas lembranças, que embora, à primeira vista possam parecer, que nos aprisionam ao passado, são elas, que na verdade nos trazem de volta a alegria de reviver tudo outra vez, mesmo que só por alguns minutos, como se transformasse num belo sorriso estampado na nossa face.

Assim, enquanto estou ali, curtindo tudo isso e dando voltas pela praça, ouço um som de bip e percebo que me esqueci do tempo! O som que ouvi era único e bem característico! Era o som buzina do velho Ford! Eu sabia que se a buzina tocava era porque o tempo estava no limite de acabar.

Meu Deus! Não vai dar tempo de pegar a caneca colorida com o meu nome gravado!

Então saio correndo, engulo o que ainda resta de amendoim torrado, guardo no bolso o saquinho plástico com o pedaço mordido da maçã do amor e entro rapidamente no carro.

Mal fecho a porta ele trepida, rateia muito, mas finalmente arranca e sai voando mais uma vez pela teia do tempo.

Recosto, mais uma vez, minha cabeça no banco e enquanto ele fura as nuvens em busca, talvez, de mais um outro lugar no tempo e no espaço, me vem uma tristeza por não ter pegado a caneca colorida com meu nome gravado e ainda mais por saber que não tenho nenhuma daquelas antigas, guardada em casa.

Então eu penso que se me fosse permitido, voltar e reencontrar aquele velho artesão e pegar a caneca recém encomendada, eu pediria para ele acrescentar, logo abaixo do meu nome, gravado com as mesmas lindas letras góticas, apenas mais uma palavra:  Saudades…

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