A porta do impossível – por José Luiz Ricchetti

A porta do impossível – por José Luiz Ricchetti

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Quando eu ainda era solteiro e estava começando a minha carreira de engenheiro, costumava aproveitar os primeiros dias das minhas férias, para curtir um pouco mais minha avó e seus quitutes.

Eu costumava ligar para ela dizendo que iria visitá-la e que chegaria para o almoço, pois sabia que ela iria preparar aquele macarrão feito em casa, com aquele molho que só ela sabia fazer. Depois do almoço, no período da tarde, lá vinha a vovó com aqueles sonhos de dar água na boca, acompanhados de um gostoso cafezinho de bule.

Minha avó era viúva e morava com duas de suas filhassolteiras. Uma delas, era professora e a outra bancária. Desde pequeno sempre tive muito apreço por essas minhastias porque elas eram daquelas pessoas que não sabiam o que fazer pelos outros.

A minha tia mais velha, era mais engraçada das duas e sempre tinha uma observação, um comentário, a acrescentar, sobre qualquer assunto que fosse pauta de uma conversa e era, antes de tudo, uma otimista incorrigível.

Assídua leitora de jornais, ela tinha o engraçado costume de lê-los em voz alta, de modo que todos os presentes, mesmo que não quisessem, eram obrigados a ouvir. Com isso a família toda ficava, mesmo sem querer, atualizada com as principais notícias da semana. 

Nos finais de semana, mais precisamente aos domingos, qualquer um, podia se sentar ao seu lado e viajar com ela pelo mundo. Ela adorava, pegar o caderno de turismo para ficar lendo e descrevendo, sempre em voz alta, cada local, cada cidade, cada detalhe, fazendo uma viagem imaginária, por todos aqueles maravilhosos destinos, que as reportagens do jornal, costumavam abordar.

Ela ia descrevendo a região, o país, suas atrações, os melhores roteiros, as melhores lojas e restaurantes, e tudo o mais de modo que quem fosse atento e prestasse atenção poderia, com tranquilidade, embarcar com ela, naquelas viagens via jornal.

O mais interessante, era que, sempre que terminava uma daquelas ‘viagens’, pelos cadernos de turismo, ela encerrava com a seguinte frase: 

– Com certeza, um dia vou visitar esse país!

A maioria dos familiares, desdenhava de seus sonhos e diziam:

– Larga mão, isso é sonho em noite de verão! Você não sabe que uma viagem dessas custa uma fortuna? Esquece! Você não tem condições!

Ela normalmente respondia: 

– Tá bom, esperem e verão! Um dia vocês vão me ver lá conhecendo esses lugares! 

Dentre essas inúmeras viagens imaginárias, eu me lembro de ouvi-la mencionar, várias vezes, que dentre todas as cidades do mundo, aquelas que ela mais gostaria de conhecer eram Miami, Atenas, Cairo e Paris. Miami pela topografia e o entorno do seu mar azul, Atenas pela história grega e o seu ‘Partenon’, Paris pela beleza dacidade luz e o Cairo pelas famosas e misteriosas Pirâmides.

O tempo passou, ela se aposentou e continuou a recitar o caderno de turismo, desfilando seus sonhos de conhecer, pelo menos uma dessas quatro cidades que ela tantodesejava ver, antes de partir para a outra dimensão.

Até que, um dia um dos seus sonhos se realizou, quando,uma de suas irmãs, casada com um empresário, à época,acabou se mudando para os USA, mais especificamente para Miami e a convidou para passar um tempo morando com sua família.

Ela morou em Miami por quase dois anos…

Em Miami, acabou conhecendo um simpático casal, vizinho de sua irmã, cujo marido era Cônsul do Egito, por quem acabou cultivando uma grande amizade.

A esposa do Consul se apegou muito a ela e também asduas filhas do casal, a ponto de, por várias ocasiões, ela dar uma de ‘baby-sitter’, ficando com as crianças, para que o casal, cumprisse sua agenda de festas e recepções. 

Passado um tempo, o Consul teve que voltar ao Egito e então, sua esposa fez um convite, se ela não queria ir para o Egito com eles, passar um tempo e ficar como uma espécie de acompanhante para ela e suas filhas, já que todos gostavam muito dela.

Então, ocorreu o segundo de seus sonhos. Era foi morar no Egito, mais especificamente no Cairo onde residiu por praticamente um ano e conheceu todas as pirâmides que sonhava um dia conhecer…

Logo depois, desse período no Cairo, o Consul egípcio foi transferido para a Embaixada da Grécia e lá foi minha tia, mais uma vez para a Grécia, com toda a família, residindo em Atenas, por mais de um ano…

No caminho da Grécia, passaram um período de duas semanas de férias em Paris e assim ela completou as quatros cidades que mais queria conhecer!

Despois desse período, vivendo com a família do Consul egípcio, ela foi diagnosticada com um câncer de mama e retornou ao Brasil. 

Aqui fez o tratamento necessário, realizou umamastectomia e pouco tempo depois teve um outro câncer, na bexiga. 

Só sei dizer, que em nenhum momento se abateu, enfrentou todas as mazelas dos tratamentos difíceis, até que venceu a sua luta e só muitos anos depois, é que veio a falecer, de velhice….

Nessa época, em que estava diagnosticada com câncer e fazia seus tratamentos, jamais a vi de cabeça baixa ou deixando de sorrir, ou sequer pessimista com alguma coisa. Continuava firme, alegre, lendo o caderno de turismo e sonhando.

Mesmo depois da mastectomia e a perda dos cabelos, que são coisas terríveis, ainda mais para uma mulher, ela se manteve firme e sempre nos deu os melhores exemplos de fé, de alegria e de otimismo.

Sempre dizia assim: – Deus não nos prometeu dias sem dor, nem dias só de risos. Ele nos deu a força da fé e o otimismo justamente para enxugar as lágrimas e seguir em frente! 

Foi com esse seu incrível otimismo, seus sonhos realizados, que aprendi que todas as coisas boas vêm com o tempo, mas as melhores vêm quando menos se espera!

Deus sempre nos mostra que mesmo quando achamos que não há mais tempo, ainda pode existir tempo para muita coisa, pois só ele sabe sempre o que é melhor para cada um de nós.

Quando me lembro daqueles nossos encontros, ouvindo ela relatar suas viagens imaginárias, seus sonhos quase que impossíveis, e como enfrentou os dois canceres, mesmo depois de já estar para lá da meia idade, percebo a importância do otimismo, da fé, do acreditar sempre, mesmo quando todos à nossa volta desacreditam.

Foi com ela que aprendi que o otimismo é irmã da felicidade e que se permanecermos com pensamentos positivos, só coisas boas serão atraídas para nós.

O fantástico Chaplin, disse algo parecido sobre tudo isso, que tomo a liberdade de reescrever assim: 

Quando sonhamos, criamos um esboço do nosso futuro, e quando aliamos a fé criamos uma extensão do espírito que é a chave que abrirá a porta do impossível! 

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thiagomelego

Jornalista por tempo de serviço, Radialista, Administrador, tecnólogo em Recursos Humanos. Estuda Análise e Desenvolvimento de Sistemas.

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